Rio de Janeiro – Se você der de cara com um macaco de dois metros vidrado no celular enquanto caminha pela Lagoa Rodrigo de Freitas ou pela Praia de São Conrado, não se assuste. É arte – e também crítica.
Até 10 de junho, o artista fluminense Beto Gatti espalha suas esculturas da série Primórdios Digitais por cartões-postais do Rio de Janeiro, colocando o dedo na ferida da nossa dependência tecnológica.
Com nomes provocativos como “Desconectados” e “La Décadence Biomorphique”, as obras são um retrato escancarado da humanidade que, mesmo cercada de natureza e beleza, continua curvada diante das telas – ou melhor, retrocedendo na escala evolutiva.
Ocupando o espaço público com provocação
As esculturas de macacos hiperconectados surgiram em pontos de grande circulação: Lagoa Rodrigo de Freitas (Corte do Cantagalo), Rua Dias Ferreira (Leblon), calçadão da Praia de São Conrado e Praça Mauá, além da já conhecida “Saudade”, exposta desde 2021 no Aeroporto Internacional Tom Jobim (Galeão).
Com até dois metros de altura e produzidas em materiais como resina, ferro, fibra de vidro e bronze, as figuras chamam atenção pelo visual impactante e pela mensagem direta: estamos cercados de gente, mas cada vez mais isolados.

De Paris ao Leblon: a inspiração da crítica
A obra Desconectados, por exemplo, retrata macacos agachados, alheios ao mundo, hipnotizados por celulares.
A inspiração? Um vídeo viral do Réveillon em Paris, quando centenas registravam o espetáculo de luzes na Champs-Élysées, mas ninguém se abraçava, ninguém se olhava.
“Isso lembra aquela imagem da evolução humana, do primata ao homo sapiens. Mas, em vez de seguirmos em frente, estamos voltando a nos curvar”, diz Gatti, cutucando com precisão cirúrgica nosso vício cotidiano.
Da feira ArtRio ao Museu Nacional
O projeto começou em 2021, como desdobramento da série A origem, com estreia na feira ArtRio e passagem por galerias internacionais em Londres e Lisboa.
Uma das peças já foi incorporada ao acervo do Museu Nacional de Belas Artes, que se prepara para reabrir após longos anos de obras.
Para Gatti, arte pública é conversa direta com a sociedade. “Vejo mães perguntando aos filhos o que estão vendo. A arte precisa causar, gerar diálogo. Quero ver como o público reage”, afirma.
Uma crítica que precisa ser olhada nos olhos
Primórdios Digitais não é só exposição: é intervenção urbana gratuita e alerta urgente sobre um comportamento que normalizamos sem perceber.
No meio da cidade, os macacos hiperconectados estão ali para lembrar que a civilização do clique talvez esteja mais próxima da selva do que imagina.
O post Macacos hiperconectados ocupam o Rio e cutucam vício digital apareceu primeiro em Diário Carioca.