Brasília – Enquanto aposentados eram surpreendidos com descontos misteriosos no contracheque, uma engrenagem de fraudes bilionárias girava dentro da Diretoria de Benefícios do INSS, transformada em feudo do Centrão durante o governo Jair Bolsonaro.
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A engrenagem era bem azeitada: entidades fantasmas, apadrinhamentos políticos, sabotagem de auditorias e muita grana. Estima-se que, em apenas três anos, o esquema tenha movimentado R$ 1,3 bilhão com supostos “descontos associativos”.
Tudo com um detalhe escandaloso: boa parte disso foi feita com o respaldo do próprio Congresso Nacional, que travou propostas de moralização apresentadas por servidores públicos.
O feudo bilionário da Diretoria de Benefícios
A Diretoria de Benefícios do INSS é, talvez, a mais cobiçada fatia da máquina pública: controla uma folha de pagamento superior a R$ 1 trilhão por ano. E foi exatamente ali que o Centrão cravou suas garras, substituindo técnicos concursados por indicados políticos, segundo revelou a Folha de S.Paulo.
Antes de 2016, sindicatos históricos, como a Contag, tinham protagonismo nos convênios com o INSS. A prática permitia descontos autorizados em aposentadorias para custear a atividade sindical. Mas com o avanço da boiada bolsonarista, surgiram entidades de fachada como Conafer, Ambec e Sindnapi — hoje todas no radar da Polícia Federal.
Conafer, repasses milionários e deputados envolvidos
A Conafer, que se autointitula uma confederação rural, viu seus repasses mensais ultrapassarem R$ 6 milhões, mesmo sem qualquer transparência ou contrapartida evidente. O deputado Euclydes Pettersen (Republicanos-MG) era o operador político da entidade junto ao INSS. Já o presidente da Câmara à época, Hugo Motta (Republicanos-PB), ofereceu até gabinete para um diretor da Conafer — numa relação promíscua entre política e grana pública.
Com a chegada da pandemia e o afrouxamento dos controles, o número de convênios disparou: 2 em 2020, 7 em 2021 e 15 em 2022. No mesmo período, a arrecadação com descontos saltou de R$ 510 milhões para R$ 1,3 bilhão.
Sabotagens, auditorias barradas e uma CPI no horizonte
A tentativa de servidores do INSS de impor limites ao esquema se deu por meio da MP 871, que buscava endurecer as regras para as entidades. O lobby no Congresso, porém, cortou suas garras.
Durante o governo Bolsonaro, o cargo-chave da diretoria foi entregue a José Carlos Oliveira, que ampliou o controle político sobre os repasses. Com a vitória de Lula, esperava-se uma guinada. Mas o Centrão continuou mandando.
André Fidelis, primeiro nomeado por Lula, era próximo do bloco e postergou auditorias internas, sendo removido. O sucessor, Vanderlei Barbosa, foi afastado após a operação Sem Desconto da PF.
A Polícia Federal ainda investiga a teia de interesses e o rastro de dinheiro que sustentou o esquema. Já são dois presidentes do INSS derrubados, um ministro demitido e uma CPI em gestação no Congresso.
Um sistema montado para sugar os pobres
O escândalo escancara como a máquina pública foi capturada por interesses escusos. A farsa das “associações representativas” serviu de biombo para canalizar recursos de milhões de aposentados — muitos sem saber sequer que tinham autorizado desconto algum.
Enquanto isso, parlamentares se esbaldavam no balcão de negócios com verbas públicas e cargos estratégicos.
A troca de governo não bastou para desmontar o arranjo. O Centrão segue firme, com tentáculos enraizados em órgãos estratégicos. O preço, como sempre, quem paga é o povo.
O Carioca esclarece
O que foi a fraude nos descontos do INSS?
Uma rede de entidades conveniadas ao INSS passou a aplicar descontos nas aposentadorias de milhões de beneficiários sem consentimento claro, com respaldo político.
Quem se beneficiou do esquema?
Entidades como Conafer, deputados do Republicanos e indicados do Centrão foram favorecidos com recursos milionários e influência na diretoria do INSS.
Quais as consequências políticas da fraude?
Até agora, um ministro e dois presidentes do INSS caíram. A PF deflagrou operação, e há pressão por uma CPI no Congresso.
Como isso afeta os aposentados?
Aposentados perderam parte de sua renda para associações fantasmas, em um golpe orquestrado dentro do próprio Estado.