O racismo ambiental é uma realidade que atravessa o Brasil. Ignorar ações que protejam comunidades negras da poluição e das mudanças climáticas é comum a governos e à iniciativa privada. Falamos sobre o caso da Ilha da Maré, na Bahia. Nesse cenário, uma parceira do Instituto de Ciência e Ecologia da UNESP (Universidade Estadual Paulista) de Sorocaba e do Instituto DACOR desenvolveu um Índice de Racismo Ambiental que pode ajudar a pautar políticas públicas em todo país.
O trabalho abrangeu cinco regiões metropolitanas: Cuiabá, Curitiba, São Luís, Manaus e Sorocaba(SP). A escolha das cidades deu-se, segundo os pesquisadores, pelo acesso a dados oficiais mais sistematizados. Em uma escala de 0 a 100, o IRA mais alto foi da região metropolitana de Manaus (20,84), seguido por São Luís (20,21) e Cuiabá (19). Os mais baixos foram registrados em Curitiba (6,88) e Sorocaba (11,16). A cidade de Autazes (AM), que obteve o IRA mais alto (41,11), apresenta uma alta porcentagem de população racializada, o que evidencia o racismo ambienta, segundo a pesquisa.
O texto afirma que a vulnerabilidade das populações racializadas é determinante para o índice, sobretudo em regiões com menores PIBs, onde a falta de saneamento e moradia adequada predominam. “O racismo ambiental surge a partir da primeira Conferência de Meio Ambiente, em 1972, em Estocolmo, na Suécia, que apontou a necessidade de uma ecologização das nossas sociedades, que o capitalismo pode ser ecologizado. Sob forte influência do movimento negro nos Estados Unidos, esse conceito se espalha pelo mundo, chegando ao Brasil, onde negros e grupos minoritários sempre foram expostos à poluição”, explica Vidal Mota, cientista social, sócio-fundador do Instituto DACOR e um dos integrantes do estudo.
Mota considera que o intuito da pesquisa é encontrar interfaces que possam acrescentar nuances nas análises, sejam elas sociais ou ambientais. “A gente procurou quantificar melhor para depois qualificar essa análise”, sintetiza. Através da metodologia fuzzy, o índice usa o saneamento básico (acesso à água e esgoto), moradia e racialização como variáveis.
O pesquisador disse que ficou surpreendido com o resultado em cidades do Sul e Sudeste. “Elas têm um índice de desenvolvimento humano bom, o PIB dessas regiões é alto, com orçamentos robustos, e elas ainda têm, mesmo que marginal, um percentual de racismo ambiental que, ao meu ver é, injustificável”.
A lógica do racismo ambiental define que a ameaça à saúde de uma população vai impactar sua expectativa de vida, sua capacidade de trabalho e aprendizado. “As pessoas que moram mal nesse país são de maioria negras ou indígenas. E aí nós temos uma série de doenças que irão superlotar os serviços públicos. Tudo isso é uma dimensão do racismo. Moradia e saneamento são condições básicas para a equidade”, atesta
O cientista social alerta que, apesar do desenvolvimento do país nos últimos 20 anos, as condições são distantes do ideal, com cerca de 45% do esgoto sem receber tratamento, o que se traduz em condições precárias para 100 milhões de pessoas – destes, 70% são negros.
Os pesquisadores pretendem adaptar o IRA para outras regiões metropolitanas do Brasil e realizar uma análise mais detalhada, segmentada por bairros. Posteriormente, incluir outras variáveis, como renda, segurança, escolaridade, mobilidade, áreas verdes.. Em julho, a parceira apresentará novos resultados.