Minuta do golpe: saiba as diferenças entre estados de sítio e defesa

As recentes descobertas da Polícia Federal (PF) revelaram uma tentativa de elaboração de fundamentação jurídica para legitimar um golpe de Estado, articulado por pessoas próximas ao ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), após a derrota nas eleições presidenciais de 2022.

A operação da PF, realizada no último 8 de fevereiro, resultou na descoberta de uma minuta na sala de Bolsonaro, na sede do PL, em Brasília. Este documento previa a declaração de estado de sítio, após eventual derrota eleitoral.

A avaliação de integrantes da Polícia Federal sugere que o discurso proferido por Bolsonaro, no último domingo (25/2), em um ato na Avenida Paulista reforçou a suspeita de uma trama para um golpe de Estado.

Bolsonaro, em sua fala diante de milhares de apoiadores, se defendeu das acusações, admitindo a existência de minutas de texto que buscavam invalidar a eleição do presidente Lula (PT).


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“O que é golpe? É tanque na rua, é arma, conspiração. Nada disso foi feito no Brasil. Agora, o golpe é porque tem uma minuta do decreto de estado de defesa. Golpe usando a Constituição? Tenha paciência”, disse.

À CNN Brasil Bolsonaro refutou as alegações de conspiração enquanto estava no poder, alegando que a defesa dele não teve acesso ao processo.

“Não sabemos o que está lá. O estado de sítio começa convocando os conselhos da República e da Defesa, incluindo autoridades políticas. Nada disso foi feito, sequer o primeiro passo foi dado”, alegou o ex-presidente.

Estado de defesa x estado de sítio

O estado de defesa e de sítio são dois instrumentos constitucionais que permitem ao presidente da República ampliar os poderes em situações de crise social, conflitos internos ou externos.

Enquanto o estado de defesa é mais específico, visando a preservação da ordem pública em casos de perturbação grave, como mencionado na minuta relacionada ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE), o estado de sítio é mais abrangente, sendo acionado em situações de guerra, como medidas extremas para garantir a segurança nacional.


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Ambos as medidas conferem ao governo a possibilidade de restringir direitos e liberdades individuais, embora em graus diferentes, em prol da manutenção da estabilidade e da segurança do país.

Compreenda mais detalhes das diferenças:

Estado de defesa

O estado de defesa, um dos instrumentos previstos na Constituição Federal, pode ser instituído pelo presidente após ouvir o Conselho da República e o Conselho de Defesa Nacional. A medida deve ser aplicada caso existam conflitos capazes de ameaçar gravemente a ordem institucional e social.

O Conselho da República é um órgão de consulta do presidente, composto por membros como o vice-presidente, os presidentes da Câmara e do Senado, líderes partidários, entre outros.

Já o Conselho de Defesa Nacional é responsável por assuntos relacionados à soberania nacional e à defesa do Estado democrático, formado por autoridades como o vice-presidente, os presidentes da Câmara e do Senado, ministros e comandantes militares.

Com restrições geográficas, o estado de defesa não pode ser aplicado em todo o território nacional. O presidente deve especificar as áreas abrangidas e indicar medidas que restringem direitos fundamentais, como o sigilo de correspondência e a liberdade de reunião.

O Congresso Nacional deve votar a validade do ato, aprovando-o com maioria absoluta, e a duração é de 30 dias, prorrogável uma vez se a instabilidade persistir.

Estado de sítio

O estado de sítio é um instrumento mais extremo, utilizado somente em casos de declaração de guerra, resposta a ataques de outros países ou instabilidades extremas que não podem ser resolvidas com o estado de defesa.

A medida requer autorização do Congresso Nacional, que deve votá-la, aprovando-a com maioria absoluta, mesmo em período de recesso. Não há restrição geográfica, podendo ser instituída em todo o país, e pode ser ilimitada em caso de declaração de guerra.

Além disso, o estado de sítio amplia os poderes do presidente, permitindo a suspensão de mais direitos individuais, como busca e apreensão sem mandado, toques de recolher, restrições à imprensa e suspensão da liberdade de reunião.

“O estado de sítio é a medida mais grave possível dentro da tentativa de garantia da ordem constitucional. A Constituição indica, por exemplo, que é preciso demonstrar a ineficácia do estado de defesa para justificar o estado de sítio”, explica o cientista político e advogado Nauê Bernardo.

A minuta descoberta na sede do PL, que previa a declaração de estado de sítio após a derrota nas eleições, representaria uma interferência indevida do Executivo na esfera da Justiça Eleitoral, extrapolando os limites constitucionais estabelecidos.

Tentativa de atentado no aeroporto de Brasília

Na manhã de 24 de dezembro de 2022, houve uma tentativa de atentado no Aeroporto Internacional de Brasília. Uma bomba havia sido acoplada a um caminhão-tanque, abastecido com 60 mil litros de querosene de aviação, prestes a entrar na área do terminal.

Os responsáveis por arquitetar o plano, identificados como Wellington Macedo de Souza, George Washington de Oliveira Souza e Alan Diego dos Santos Rodrigues, queriam provocar o que chamavam de “comoção social” capaz de desencadear o decreto de estado de sítio e intervenção militar.


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A motivação seria a insatisfação com a vitória de Lula sobre Jair Bolsonaro. Os criminosos achavam que essa seria a solução para tirar o petista do poder.

Segundo Nauê Bernardo, uma grave perturbação à ordem institucional, como o quase atentado no aeroporto, poderia ser uma razão para invocar o estado de sítio devido à gravidade do evento.

“Isso entraria numa hipótese de abalo institucional grave. Poderiam acusar o sistema de segurança de grave falha, por exemplo, e contribuir para minar a confiança da população nesses órgãos. Num contexto de ânimos acirrados, isso seria riscar um fósforo numa sala cheia de gás”, explica o especialista.

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